Você já sentiu que algumas pessoas carregam uma tempestade dentro de si, mesmo em dias de céu azul? Essa é uma forma de descrever o que muitas pessoas com transtorno de personalidade borderline (TPB) enfrentam diariamente. É um turbilhão emocional que parece invisível para os outros, mas faz um estrago enorme por dentro.
Quando pensamos em borderline, logo vêm à mente a instabilidade emocional e o medo de abandono. Mas e aqueles sintomas que quase ninguém fala? Eles existem, e estão lá, moldando o cotidiano dessas pessoas.
Imagina estar em uma sala cheia de gente conhecida e, ainda assim, sentir um vazio profundo. Ou perceber que uma mensagem deixada sem resposta te joga em um ciclo de dúvidas e insegurança que parece sem fim.
São sintomas que não estampam manchetes, mas que estão presentes e fazem um estrago silencioso.
1. Sentimento de vazio constante
Pensa comigo: você já teve aquela sensação de insatisfação, mesmo depois de alcançar algo que queria muito? Agora multiplica isso por mil e imagina sentir isso todos os dias, sem motivo aparente. Esse é o vazio emocional que muitas pessoas com TPB descrevem.
Por exemplo: Ana costuma dizer que é como carregar uma mala pesada, mas que nunca sabe o que tem dentro. Ela está sempre buscando algo para preencher esse espaço: um novo hobby, uma nova amizade ou até um projeto no trabalho. Só que, assim que ela alcança o que queria, o vazio volta. E sabe o que é pior? As pessoas ao redor muitas vezes dizem coisas como: “Mas você tem tudo, por que está se sentindo assim?”.
Isso não é algo que dá para resolver com uma boa conversa ou uma mudança de ambiente. É um sintoma profundo, ligado à forma como o cérebro da pessoa processa emoções e experiências. E aqui vai uma dica: se você conhece alguém que vive isso, evite julgar. O que ela precisa é de presença e apoio, não de soluções mágicas.
2. Dificuldade em confiar
Lembra aquela vez em que você pensou que um amigo estava bravo com você, só porque ele respondeu “ok” de forma seca? Multiplica isso pela vida inteira. Para quem tem TPB, confiar nos outros é um exercício diário de equilíbrio emocional.
Por exemplo: Lucas sempre foi uma pessoa generosa e cheia de amor para dar, mas vive com uma desconfiança constante. Uma vez, contou que sentiu um aperto no peito porque uma colega de trabalho não o convidou para o café do escritório. “Será que ela me odeia? Será que falei algo errado?”, ele pensou. Era só uma situação casual, mas para Lucas parecia o começo de um abandono iminente.
Essa dificuldade em confiar leva a comportamentos extremos: evitar relações para não se machucar ou, ao contrário, exigir reafirmações constantes de afeto. O que Lucas ensina é que paciência é essencial. Às vezes, tudo que ele precisa é de um ‘Ei, você está bem?’ para se sentir seguro de novo.
3. Sensibilidade extrema à rejeição
Você já deixou alguém no “visto” e nem percebeu? Para a maioria das pessoas, isso não passa de um detalhe. Mas, para quem tem borderline, é uma explosão emocional. Essa hipersensibilidade à rejeição é como uma lente de aumento para cada pequena interação.
Por exemplo: Júlia, que terminou uma amizade de anos porque sua melhor amiga não a marcou em uma foto no Instagram. Parece exagero, né? Mas, na cabeça da Júlia, isso significava que ela não era mais importante. Ela passou a noite em claro, revivendo cada conversa para tentar entender onde tinha “errado”. No dia seguinte, mandou uma mensagem furiosa, dizendo que nunca mais queria falar com a amiga. E tudo isso, claro, sem saber que a amiga tinha esquecido de marcar qualquer pessoa naquela foto.
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Se você conhece alguém assim, lembre-se: não é drama, é dor real. Um gesto simples, como explicar a situação de forma calma e reafirmar o carinho, fará toda a diferença. E, se você é essa pessoa sensível, crie um “tempo de espera” antes de reagir – isso evita decisões impulsivas.
4. Crises de identidade
Você já se olhou no espelho e teve a sensação de não se reconhecer? Para quem vive com TPB, isso é um sentimento constante. As crises de identidade fazem com que a pessoa se sinta como um camaleão emocional, mudando de cores para se adaptar ao ambiente.
A Bia, por exemplo, já quis ser advogada, tatuadora, professora e escritora – tudo em menos de um ano. Não é que ela seja indecisa; ela simplesmente não consegue se enxergar com clareza. “Eu começo algo e, de repente, sinto que aquilo não sou eu”. Isso a deixa frustrada, como se nunca fosse boa o suficiente em nada.
Se você está passando por algo parecido, experimente um exercício simples: escreva uma lista das coisas que realmente importam, independentemente do que os outros pensam. Revisitar essa lista ajuda a encontrar um ponto de equilíbrio em meio ao caos.
5. Vergonha e autocrítica
Por último, temos um sintoma que, embora escondido, é extremamente paralisante: a vergonha e a autocrítica excessivas. Imagine carregar um juiz severo dentro da sua cabeça, que critica cada palavra, cada gesto e até mesmo cada pensamento.
A Clara é o melhor exemplo disso. Certa vez, ela fez uma apresentação incrível no trabalho, mas cometeu um pequeno erro de cálculo. Em vez de celebrar o sucesso, ela passou a semana revivendo aquele detalhe. “Eles devem achar que sou incompetente”. Mas ninguém percebeu o erro; era só ela contra si mesma.
Se isso soa familiar, tente praticar a autocompaixão. Faça o exercício de falar consigo mesmo como falaria com um amigo. Afinal, você não diria para um amigo: ‘Nossa, como você é incapaz!’, né? Então por que dizer isso a si mesmo?
Um apelo ao emocional: é sobre conexão
O que essas histórias têm em comum? Elas mostram que o borderline não é só sobre explosões emocionais ou comportamentos impulsivos. É sobre como a mente transforma situações cotidianas em batalhas gigantes. É sobre carregar pesos invisíveis que ninguém mais enxerga.
Se você conhece alguém com TPB, lembre-se de que o maior presente que você pode dar é a sua empatia. Ouvir sem julgar, estar presente sem tentar “consertar” e oferecer apoio constante são gestos que fazem toda a diferença. E se você está enfrentando isso sozinho, saiba que pedir ajuda não é fraqueza. É coragem.
Perguntas frequentes
- Como lidar com o vazio emocional?
Experimente atividades que tragam significado e trabalhe a aceitação com ajuda terapêutica. - Por que o borderline tem dificuldade em confiar?
É um mecanismo de defesa ligado ao medo de abandono. - Como reagir à sensibilidade à rejeição?
Com paciência e comunicação clara, evitando julgamentos. - As crises de identidade podem melhorar?
Sim, com autoconhecimento e acompanhamento terapêutico. - A vergonha e a autocrítica podem ser superadas?
Sim, com práticas de autocompaixão e reestruturação cognitiva.
Resumo
Sintoma | Exemplo do cotidiano |
---|---|
Vazio constante | Buscar hobbies ou distrações sem nunca se sentir satisfeito. |
Dificuldade em confiar | Pensar que um amigo distante não gosta mais de você. |
Hipersensibilidade à rejeição | Sentir-se rejeitado porque alguém não respondeu a mensagem. |
Crises de identidade | Mudar frequentemente de objetivos ou ideias sobre si mesmo. |
Vergonha e autocrítica | Repetir mentalmente erros pequenos, sentindo-se incapaz. |
Palavras finais
O transtorno de personalidade borderline é um lembrete poderoso de que nem tudo o que vemos reflete o que realmente está acontecendo dentro de alguém. Por trás de comportamentos que parecem exagerados, há uma dor legítima e profunda. Saber disso é o primeiro passo para oferecer apoio e compreensão.
Se você vive com TPB, lembre-se de que não está sozinho. A terapia pode ajudar muito. E, acima de tudo, seja gentil consigo mesmo. Você merece o mesmo cuidado que oferece aos outros.
Para quem está do outro lado, seja amigo, parceiro ou familiar, saiba que sua presença é um farol no meio da tempestade. Com empatia e paciência, é possível criar um espaço onde a pessoa se sinta segura para ser ela mesma.
Referências
- Associação Brasileira de Psiquiatria. (2023). Transtornos de Personalidade. Disponível em: https://www.abp.org.br.
- Mind, UK. (2022). Borderline personality disorder. Disponível em: https://www.mind.org.uk.
- Linehan, M. M. (1993). Cognitive-Behavioral Treatment of Borderline Personality Disorder. New York: Guilford Press.
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